Precisamos falar sobre estupro

O nome do meu blog não é à toa. Escolhi esse nome por resumir minha vontade: dar opinião. Mas hoje as palavras faltam. Não faltam por serem poucas, faltam por serem muitas e não caberem nos espaços programados. Por não caberem na racionalidade que a vida e a escrita (me) cobram.

Essa semana uma adolescente foi estuprada por 33 homens que, além dessa barbaridade, filmaram e tiraram fotos do ato e após ele, ridicularizando-a, e postaram na internet. Confesso que isso foi tão brutal que eu não sabia nem como abordar os tema. Não porque fico sem jeito – pelo contrário, tenho fortes opiniões e posições sobre – mas porque as abordagens são múltiplas e tudo passa na minha cabeça em um segundo, e a todo segundo.

Eu poderia falar do quanto é absurdo esse ato desses homens, e poderia dizer que, diferente do que muitos pensam, não são doentes ou animais, são mesmo homens na nossa sociedade, em sua liberdade de homem. Eu poderia falar das questões psicológicas que envolvem vítimas dos diversos crimes simultâneos que a jovem sofreu, e como isso pode – e vai, porque ninguém é nem precisa ser forte assim – afetar a vida prática dela mas também a minha, a sua, a da sua mãe, sua irmã, sua avós, sua tia, sua filha, suas amigas, colegas de trabalho etc.

Eu poderia amaldiçoar esses homens – e o faço a todo momento. Eu poderia chorar – e o fiz quando li pela primeira vez o caso. Eu poderia falar da cultura do estupro em que vivemos, e explicar que “cultura do estupro” é, resumidamente, o fato de nossa sociedade ter artimanhas para que violências contra as mulheres, principalmente a objetificação de cunho sexual, seja menorizada, ignorada, tratada como algo pouco significativo, como mimimi, enquanto os instrumentos de defesa das mulheres são ambíguos, parcos, fracos. É a cultura que divide a mulher em “vadia” e “pra casar”, que acha que mulher é um “sexo frágil”, que acha que bonito é contar quantas mulheres pegou na balada, como se elas fossem as moedinhas do troco da cerva que ELE comprou. É a cultura que aceita como justificativas “ela estava procurando”, “achei que ela tava gostando”, “ela me olhou assim ou assado, tava pedindo”. É a cultura que aceita um “ela não se cuida, não se dá ao respeito” ao invés de “ela merece respeito”. É essa cultura e muito mais.

É a cultura que vivo todo dia com medo de sair na rua e passar por qualquer grupinho de homens, principalmente de noite ou próximo de uma obra. É a cultura que me faz andar de cara fechada e ter a famosa Resting Bitch Face, para que nenhum homem ache que eu to sorrindo ou feliz porque to dando mole. É a cultura que me faz usar calça jeans no calor de 35º pra ninguem ficar me secando nem mexendo comigo.

É a cultura que me faz perguntar a todas as minhas amigas se não é muito perigoso irmos praquele lugar badalado novo na cidade, porque duas mulheres sozinhas naquela região, a gente já sabe. De carro então, tendo que andar sozinhas pro estacionamento, vish! E de ônibus? de madrugada? ai, amiga, não vai rolar. Taxi, então? mas e quem vai por ultimo e ficar sozinha com o motorista? me avisa quando chegar em casa, viu?! NÃO ESQUECE!! Cuidado. E me faz rezar para que elas cheguem logo, sãs e salvas, e não me deixa dormir enquanto eu não tiver notícias.

Mas, AINDA, isso tudo é pouco. Não é tudo, não é todo o meu dia, todos os dias.

Como disse uma postagem no facebook,

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E eu ouço muito, inclusive de homens próximos de mim, que não são todos assim. Eu sei. Mas quem é? quem não é? Eu vou pagar pra ver? não, obrigado. Nem ela vai. Nem nenhuma de nós vamos. Aí a gente tem que desenhar:

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E o pior, quem programou todo o ato foi o companheiro, ficante, namoradinho, peguete dela. Não foi qualquer um. Não foi um estranho – foram 32, diga-se de passagem. 32 + 1, um daqueles que a gente tem em volta e diz que nunca faria algo assim. O número de casos de mulheres violentadas por companheiros é gigante. Números que a sociedade mascara. Números que os homens – enquanto uma espécie de classe própria – dizem ser exagerados: e assim vendem a ideia. E assim muitos compram a ideia.

Independente das suas crenças políticas, sociais, pessoais/religiosas, você é mulher. Você é SER HUMANO, mas isso não basta. Você deveria ser respeitada independente do que é, de como é, do que gosta, usa ou acredita. Mas não é.

Resta-nos o medo. Resta-nos, ainda mais, a luta.

SCN – Libere-se!

Oioioi galerinha!

Hoje o post da Semana da Consciência Negra é bem especial: vamos falar de cabelos!

Mas não de qualquer cabelo, e sim de cabelos crespos, deixando a africanidade falar mais alto! Nossa ideia é mostrar, ainda mais, a beleza dos cabelos cacheados, de todos os tipos de cacheados, mas principalmente aqueles cheios, volumosos e deslumbrantes, e que muitos ainda teimam em esconder e “não gostar”.

É obvio que todo mundo tem direito de gostar ou não de algo, mas os valores que nos são encrustados pela sociedade são valores brancos eurocêntricos, que ordenam nossa visão de mundo. A partir disso, ver um cabelo crespo e achar que parece bombril, achar feio e até sujo não é questão de opinião! É questão de preconceito, pois tem por base uma cultura racista cujos padrões de beleza são claros, lisos e finos – pele branca, olhos claros, cabelos lisos, mulheres magras.

Eu, como branca e do cabelo liso (não escorrido, mas liso), não posso falar com propriedade sobre o assunto, então fui atras de vídeos para voces que ajudam a cuidar dos cachos e deixá-los ainda mais volumosos e com brilho.

Primeiro é um vídeo sobre produtos para cabelos crespos. Peguei o vídeo da Cindy Rizos, que obviamente não mostra todos os produtos possíveis, mas mostra vários, para várias finalidades 😉

O segundo vídeo é do canal da Suzane Camila, sobre deixar os cachos perfeitos, do corte ao tratamento 😉

Por último, peguei dois vídeos do canal da Rayza Nicácio sobre penteados para cabelos crespos. Se inspirem e se joguem!

E aí, quais voces preferiram??

Comentem, curtam e sejam felizes ;D

beijsss!

SCN – esporte e antirracismo

Oioioi!

Continuando nossa Semana da Consciência Negra, o terceiro post é uma reportagem sobre Peter Norman, um homem branco que, no auge de sua carreira preferiu ser rechaçado pelos seus “pares” nacionais, do que ver o preconceito e racismo continuarem tomando conta do esporte mundial.

Em 1968, o australiano Peter Norman participou das Olimpíadas de Verão na Cidade do México, representando seu país, e ficou em segundo lugar. Dividindo o pódio com ele estavam os americanos Tommie Smith (em primeiro) e John Carlos (em terceiro).

Tudo parece normal até aqui. E mesmo que eu diga que os dois americanos eram negros, espera-se que isso não faça diferença: temos vários nomes de negros vencendo competições olímpicas, principalmente de velocidade. Porém não podemos nos deixar enganar. Em 1968 o mundo ainda era hostil aos não brancos, fossem negros africanos ou “negros da terra” (povos autóctones), e vários países viviam a dicotomia dos grupos brancos no poder e a grande parte da população (pobre e marginalizada) negra.

Essa dicotomia se traduzia no movimento negro organizado em diversas instâncias, lutando por direitos, reconhecimento e igualdade.

Norman era um branco natural da Austrália, um país que tinha leis de apartheid rigorosas, quase tão rígidas como as da África do Sul. Havia tensão e protestos nas ruas da Austrália na sequência de pesadas restrições a imigração não-branca e a leis discriminatórias contra os aborígenes, algumas das quais consistiam em adopções forçadas de crianças nativas a famílias brancas. (Geledés, 26 out. 2015)

No esporte essa luta fazia parte do Projeto Olímpico para os Direitos Humanos – grupo que buscava mostrar a realidade dos atletas afro-americanos (estendendo-se à realidade do preconceito racial em todo o mundo) e combatê-la.

Smith e Carlos decidiram utilizar suas posições no pódio para protestar: descalços, simbolizando a miséria do povo negro, e com uma luva preta na mão, em apoio à causa dos Panteras Negras, os dois levantaram os braços de punhos fechados e ficaram em silêncio durante o hino nacional norte-americano.

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E o que tinha Peter Norman a ver com tudo isso? Acontece que Peter Norman não apenas dividiu o palco com os dois negros americanos, como apoiou a causa dos dois. Além da luva, do braço erguido e dos pés descalços, um detalhe chama – ou deveria chamar – atenção: eles usavam um adesivo, o adesivo do Projeto Olímpico para os Direitos Humanos. Eles TRÊS usavam.

Como forma de apoio aos colegas, que para Peter Norman não eram menos do que seres humanos como ele próprio, independente da cor da pele, ele usou também o adesivo durante sua passagem pelo pódio. Atitude essa que lhe causou muitos problemas para o resto de sua vida.

O apoio de Norman é ainda mais valoroso por não tentar protagonizar a luta dos negros. Ele não era um branco usando a simbologia própria da luta negra. Ele era um branco usando um adesivo que simbolizava seu apoio à essa luta.

A vida continua…?

Bem, Peter Norman voltou para a Austrália mas não teve o reconhecimento merecido. Nas olimpíadas de 1972 se classificou mas não foi chamado para participar da equipe australiana, sendo sumariamente excluído do esporte de competição, relegado ao esquecimento.

Na sua Austrália branqueada, resistindo à mudança, ele foi tratado como um estranho, a sua família foi proscrita e incapaz de arranjar trabalho. Trabalhou uns tempos como professor de ginástica, continuando a lutar contra as desigualdades como sindicalista e trabalhando ocasionalmente num talho. (Geledés, 26 out. 2015)

A Austrália, que, na época, vivia uma espécie de apartheid próprio, demorou até 2012 para reconhecer o valor do maior velocista de sua história, e também reconhecer a necessidade de um pedido formal de desculpas a Peter Norman, que havia morrido em 2006.

Durante anos, Norman teve a possibilidade de voltar a ser alguém para seu país: condenando publicamente seus colegas de pódio e se arrependendo do que fez. Peter Norman morreu no ostracismo ao qual seu país o relegou, sem poder seguir seus sonhos – mesmo tendo todas as qualificações possíveis – e sem receber o reconhecimento necessário e merecido.

Nas palavras de John Carlos:

“Se nós fomos espancados, Peter enfrentou um país inteiro e sofreu sozinho.” (Geledés, 26 out. 2015)

Nas palavras do próprio Peter Norman:

“Não podia ver por que razão um negro não podia beber a mesma água de uma fonte, apanhar o mesmo autocarro ou ir à mesma escola que um branco. Havia uma injustiça social contra a qual nada podia fazer a partir de onde estava, mas que detestava. Foi dito que ter partilhado a minha medalha de prata com aquele incidente no estrado da vitória diminuiu o meu desempenho. Pelo contrário. Tenho de confessar que fiquei muito orgulhoso por fazer parte dele.” (Geledés, 26 out. 2015)

Abaixo, um documentário sobre esse momento que mostrou que o esporte é muito mais do que apenas esporte, é sociedade, identidade, política, realidade.

 

Veja mais em…

O homem branco naquela fotografia, do site Geledés. 26 ou. 2015.

Hoje na História: 1968 – medalhistas olímpicos são punidos por protesto contra discriminação racial, do site OperaMundi. 17 out. 2010.

Ongoin Aboriginal Genocide and Aboriginal Ethnocide by Politically Correct Racist Apartheid Australia, por Dr. Gideon Polya. 16 fev. 2014.

“I will stand with you”: finally, an apology to Peter Norman. 12 out. 2012.

SCN – Make básica para pele negra

Oioioi, galera!

Continuando os posts da Semana da Consciência Negra, hoje é um post de make para pele negra. Para isso, eu vou usar os posts da blogueira linda Camila Nunes, do Camila Nunes Makeup 😉

Eu tirei para postar aqui dois vídeos do canal dela no youtube, Camila Nunes. O primeiro é sobre preparação da pele e iluminação…

…e o segundo é um vídeo com uma make básica para a pele negra.

Além dessas dicas, voces podem encontrar no blog dela vários posts sobre pós, bases, iluminadores, bb cream e muito mais para peles negras.

O site Total Make Up, em parceria com o Luminatti Centro de Beleza, também fez um vídeo sobre preparação da pele negra. Deixo aqui o vídeo com voces, pois são mais dicas, e isso é sempre bom, mas eu tenho uma ressalva sobre eles tratarem como “pele morena”, um eufemismo para a real cor dessas mulheres lindas, e que é um eufemismo que tem uma formação elitista e branca por trás. SÃO NEGRAS!

É isso, se joguem e sejam felizes!

beijs!

SCN – Luis Gama

O primeiro post da nossa Semana da Consciência Negra será sobre Luis Gama, nascido escravo em Salvador em 1830. Filho de um português e uma negra escrava, foi vendido aos 10 anos pelo pai e alforriado em 1847.

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Desde sua libertação, Gama lutou pelo fim da escravidão, tornando-se um grande abolicionista do século XIX. Analfabeto até os 17 anos, ele aprendeu a ler e escrever, além de ser autodidata em Direito.

Trabalhando como advogado, Luis Gama defendeu e libertou mais de 500 escravos. Morreu em 1882, seis anos antes da Lei Áurea, que concretizou a abolição da escravidão.

Mesmo sendo um intelectual da época – advogado, poeta, jornalista -, a história de Luis Gama ficou anos não reconhecida, e sua atuação como abolicionista só foi reconhecida pela OAB no dia 03 desse mês novembro de 2015, dando a Gama o título de advogado.

É curioso que Gama apresente sua mãe como sendo Luisa Mahin, personagem importante para o Movimento de Mulheres Negras atualmente. Curioso pois estudos apontam que Luisa Mahin tenha sido, talvez, uma invenção – mas uma invenção que deu identidade, esperança, fé e luta há muitos grupos. Dulcilei da C. Lima (2009) nos apresenta a tese de Lígia F. Ferreira (2001) a partir da análise do poema “Minha Mãe” e uma carta autobiográfica escritos por Gama, de que há

contradições presentes nesses documentos, que equivaleriam à confirmação de que se trata de uma personagem fictícia. Exemplo disso é a condição religiosa de Luiza: no poema, Gama atribui à mãe a religiosidade cristã e, mais tarde, na carta enviada ao jornalista, afirma categoricamente que a mãe manteve-se pagã, pois sempre recusou o batismo e a doutrina cristã. (Lima, 2009, p. 02, grifo da autora)

Além disso, outras teses apontam para contradições na imagem de Luisa Mahin. Considerada símbolo importante da Revolta dos Malês – quando  em 1835 um grupo de negros escravos de origem muçulmana se revoltou em Salvador, buscando criar uma nação malê islâmica na cidade – pelo menos duas visões se interpelam sobre o papel da negra no conflito.

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Pedro Calmon, em 1933, escreveu um romance sobre a revolta, no qual colocou Luiza Mahin no papel de traidora por ter denunciado os planos dos revoltosos às autoridades. Já na década de 70, Arthur Ramos escreveu de Luiza Mahin foi uma grande expoente do movimento, sendo em sua casa as reuniões dos revoltosos, estando ela mesma como uma das líderes. (Lima, 2009, p. 02)

Assim, é difícil discutir qual o papel real de Luiza Mahin na revolta, ou mesmo sua biografia, tendo cada autor se apropriado de informações diferentes e contraditórias. Porém é interessante a relação entre Luis Gama e Luiza Mahin, ambos importantes para o movimento, memória e história negros!

Veja mais em…

O sonho sublime de um ex escravo. Reportagem da Revista de História.

Luis Gama (1830-1882): Enfim advogado. Reportagem do Estadão.

LIMA, Dulcilei da Conceição. Luiza Mahin: estudo sobre a construção de um mito libertário. XXV Simpósio nacional de história da ANPUH. Fortaleza, 2009.